sábado, 28 de fevereiro de 2009

ESTRANHEZA



Coisa estranha é a vida que nos foi dada p'ra viver.

É tão simples e tão misteriosa...


São tantos os caminhos que temos que escolher; são tantos outros que escolhem por nós! Muitos são os que nos fazem importantes, muitos outros nos tornam pequenos e impotentes. Muitos deles desejaríamos abandonar, descobrir novos e ir seguindo. Apenas indo, deixando nossos rastros falar por nós.


O lado simples da vida nos coloca frente a nós mesmos e a nossa verdade é simples e silenciosa e por ser assim, incompreensível. Não compreendemos a lógica infantil nem a perseverença das ervas dos campos, que arrancadas, renascem mais viçosas e enchem os campos de flores e de perfumes. Não compreendemos o sol que nasce todos os dias para todos, sejamos bons ou maus. Não compreendemos os horrores da guerra, nem as injustiças, nem a falta de fraternidade dos homens.


São atos simples como o nascer e o morrer...e nem a esses compreendemos.
Tentamos, contudo, porque somos teimosos. Ora compreendemos, ora aceitamos, ora nos acomodamos.


Se enfrentamos o medo, quiçá nos condenaremos ao sabor amargo da derrota e realizaremos em nós mesmos a guerra fria ao sentimento. E é neste estado racional e emocional que se centraliza a simplicidade do ser homem como Deus o criou.


Não somos o que vemos. Somos o que não queremos enxergar. Somos o invisível ora amoroso, ora tenebroso, ora em trevas, ora iluminado.
Somos
(i)mortais, ainda ignorantes caminhando por terras desconhecidas em busca de um saber que nos leve de volta rumos ao infinito de onde viemos.


sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

COMO ALMA GÊMEA





Olha quero lhe falar da minha importância em sua vida.


Você nem percebe o quanto estou dentro de você e dentro dela!


Veja meu amigo, estou sempre perto de você, como o seu coração que bate ( eu por mim, tilinto!) incessantemente como se quisesse lhe transmitir a vida.


Ora consigo levá-lo para outras terras, outros continentes: ora lhe falo perto e sem querer obrigo-o a fechar os olhos quando sôo-lhe alto aos ouvidos.


Às vezes assumo vozes distantes, como fantasmas do passado, outras é o presente que insiste em ficar. Mas meu querido, você não pode reclamar, sou tão providencial que hoje mesmo consegui lhe ajudar na solução de um grande negócio e nem o trabalho de arredar pé de casa teve.

Depois dei-lhe uma má notícia, Sei que sofreu, mas que podia fazer?

Fiquei com pena de você , mas era preciso que soubesse.


Estou tão próximo e você necessita tanto de mim que um sócia meu até já adquiriu para acompanhá-lo casa-a-fora. Então colo-me ao seu ouvido, sinto sua respiração e sua voz bem próximo as minhas cavidades sonoras e passo a perseguir-lhe os passos, tomo conta de todo o seu ser. Já não dou tempo nem para o banho nem para o sono . Sou possuidor do seu corpo e do seu coração. Sou tão você que lhe perturbo a paz e a amizade.


Quem ousa tomar-me o lugar em teu coração, sai danado da vida comigo, pois lhe abrigo a falar a prestação. Chato, não é? Mas é que sou tão possessivo na minha função de comunicar ( fatos importantes, fofocas e os últimos acontecimentos, que juro, se preciso for, provoco um reboliço tal em sua vida que irei viajar consigo e então não poderá afastar-se de mim nunca mais. Serei seu ar, sua fome, sua emoção e seu espírito. Você então viverá sob meu controle e no lugar do tum-tum que não acaba mais de teu coração ao avistar a pessoa amada, se ouvirá apenas o som grave e irritante do meu penetrante tilintar:


-Trim-trimm-trimmm-trimmmm!!!

domingo, 8 de fevereiro de 2009

NECESSIDADES


É preciso estar aberto para viver os descaminhos da vida.
Nem sempre o que desejamos acontece, nem sempre amamos quem queremos, nem sempre realizamos nossos sonhos.


O bom da maturidade é que vamos aos poucos desvendando os segredos da vida; vislumbrando revelações inceitáveis a luz da razão. Desnudando-nos das roupagens conceituais e percebendo o lado divino das situações inexplicáveis, vivendo-as no zelo da doença-vida.


Vamos buscar alento nas carências uniformes bilaterais num uníssono de almas que anseiam pelo fim único: o amor, mesclado por particularidades que se perdem no tempo de nós. Vamos juntos acalentar a criança pequena no adulto disforme pela cultura social, que deseja carinho, que deseja colo, que deseja o seio da mãe, que deseja o desejo de se ter por inteiro e simplesmente para ser feliz, um coração.


Estamos sós no amor que possuímos, única riqueza, única fonte de luz e graça que, expulsa do Jardim do Éden, aninhou-se, sem jeito,envergonhado, no coração. E somos únicos no mundo, senhores do universo contido na alma, desejosos de possuir o mundo, para depositá-lo aos pés sagrados do deus do amor, quem sabe eu, que fiz o meu mundo, quem sabe nos braços que se foram, companheiros que eram na estrada que se bifurcou.



".... é preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã!...

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

ENROLADOS NOS PAPEIS




N'outro dia parei estarrecida ante a dificuldade de encontrar um papel. Até aí nada demais, afinal o que é um papel? Simples derivado de vegetais que transformado pela ação química adquire diversas utilizações: uns embrulham ricos presentes que alegram os momentos festivos da vida; outros os alimentos que nos mantém vivos e outros limpam as sujeiras de partes do corpo.
Até aí tudo bem.

Há porém outros papéis bem mais complexos e difíceis de se lidar. São os papéis que vamos aos poucos desempenhando pela vida afora.

Há o papel criança:
* bem amada, super protegida, zelada e mimada ( tanto que não dá para ser útil, tal o zelo!).

* abandonada, amassada, jogada aos cantos e esquinas da vida, como se um brinquedo velho fosse...

*adolescente: buscando seu caminho teima em ser acreditado em sua utilidade; alguns acreditam que servem para embrulhar alguma coisa, outros os pensam inúteis e os deixam de lado - esquecidos até perderem o prazo de validade e cairem no esquecimento de sí mesmo.

Há o papel de mil e uma utilidade:
Embrulham tudo, assumem qualquer presente: coisas velhas e sem serventia, sapatos, roupas e jóias; finos móveis , carros e casas.... Fazem o super papel ( heróis?) ! Outros se saem mal não conseguem embrulhar nada: nele tudo se escreve e tudo se apaga. É riscado, amassado, rasurado. Pensamentos são anulados, suprimidos os ideais: são rotos e desvalorizados.
É o caos, é o lixo , é o fogo.

Há também os papeis títulos:
Hierarquizados, arrumados de cima pra baixo, socialmente valorizados, mas espezinhados na essência pela sede de poder e de estar entre os melhores papeis: são do tipo papel couchet.

Aí, chega o dia em que, preocupado, cônscio de desempenhar bem o papel que lhe cabe, percebe abismado que, como ser de nada vale: os papéis tomaram-lhe o lugar, o espaço, a personalidade.

Eu o vejo, toco, sinto sua infinitude - mas prova-me, por favor, que existes. Apresenta-me o papel do teu nascimento. Tens companheira? Nas noites de frio ela te aquece com o calor do corpo? Te dá afeto e carinho? E teu deslevo por ela é imenso? Cadê o papel do casamento? Sem ele teu amor não existe, nem consta nos livros sociais...

Teus filhos são bonitos e preenchem o vazio de teu coração suavizando-te os sofrimentos? É por eles que labutas noites e dias, enfrentas o frio e o calor das horas de trabalho? Existe o labor diário para alimentá-los e mantê-los saudáveis mas... já passaste pelo cartório para provar que existem mesmo?

Ah, agora é tua mãe que morreu. Lágrimas quentes e incontroláveis rolam-te pelo rosto. A dor dilacera teu coração. Nunca mais ouvirás o som da voz cansada pelos sofrimentos da vida, nunca mais os passos miúdos rondando pela casa em busca do quê fazer, nunca mais o afago nos cabelos e a palavra amiga a te confortar. O corpo está frio num caixão qualquer. Perdeste o pedaço mais importante de ti mesmo: a origem de de tudo o que és. Para livrá-la da decomposição visível e desprezada pelos sentidos humanos necessitas do papel-óbito, provando assim, indubitavelmente a sua morte.

E assim a existência da obra preciosa do Criador é transformada em um simples papel que depois de amassado, rasgado, triturado, torna-se uma massa molhada por lágrimas do oceano insecável dos teus olhos, que se vêem transformados em papel marchet, que se molda de acordo com os ditâmes da sociedade que tu mesmo fizeste.

Até aí, tudo bem, afinal estamos todos mesmo enrolados nos papéis escolhidos por nós mesmos!

E é neste contexto de embrulhados e embrulhantes que um dia, cansados de tanto ansiar por desempenhar um papel que represente a imagem do que somos realmente nos decidimos pelo papel reciclado buscando uma nova chance de fazer diferente, com nova cor, um outro destino.

Até aí não mais tudo bem... mas agora está tudo bem!